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sexta-feira, 23 de julho de 2010

CUBANOS: FAMINTOS E BARRIGUDOS?

A chegada dos sete primeiros dissidentes cubanos à Espanha causou grande reboliço no aeroporto de Barajas, em de Madri, com espetacular cobertura dos meios de comunicação, principalmente a imprensa direitista, como O Globo. Eufóricos, diantes de tantos jornalistas e câmeras de televisão, os libertados prisioneiros não pouparam o regime e as condições em que viviam, passando fome, sofrendo espancamento em prisão imunda, com ratos e baratas. Achei estranho, porque não vi ninguém esquálido, com rosto macilento, nenhum sinal de tortura, mas alguns deles com barrigas proeminentes e fisionomia saudável, robusta. Engravatados, pareciam executivos vindos de algum congresso.

Mas passada a euforia, a espectativa promissora de se poder viver num mundo livre e próspero, logo veio a frustração com o “espírito humanitário” do governo de Zapatero, que os hospedou em calorentos quartos de um hotel de quinta categoria (ironicamente chamado Hotel Welcome), diártia de R$ 30, localizado num bairro dormitório e distante de Madri. A “recepção humanitária” foi tão decepcionante que um dos cubanos, sentindo-se enganado, foi logo dizendo que estavam como desterrados, isolados, sem saber o que fazer. Chegaram até criticar o presidente Lula, por acharem que ele se omitiu em relação ao prisioneiro em greve de fome, quando esteve em Havana. Agora, vão ter que se virar num país com 20% de desemprego, aprender a viver num ambiente capitalista onde prevalece o individualismo e forte competição.

Os dissidentes merecem reconhecimento pela coragem de se expor, correndo perigo para exigir a redemocratização de seu pais, porque, depois de mais de meio século da vitoriosa revolução comandada por Fidel Castro e seus poucos guerrilheiros da Sierra Maestra, defenestrando do poder o truculento e corrupto ditador Fulgêncio Batista, já era hora, neste novo século, de uma distensão, ainda que gradual, para o povo respirar o ar de liberdade necessário a qualquer ser vivo e vivenciar a verdadeira razão de sua dura luta. O fato é que nenhuma ideologia, nenhum regime, nenhum sistema econômico tem razão ou base política, e muito menos filosófica ou religiosa, para impedir o ser humano de exercítar o contraditório, a livre expressão da atividade intelectual, de manter inviolável sua intimidade, a vida privada, de ter acesso à informação e o direito de ir e vir, como está assegurado em nossa Constituição.

Mas para Fidel, a abertura do regime, diante de sedutores apelos capitalistas e da versátil tecnologia da informação, seria difícil manter os ideais da revolução preservados, daí seu firme propósito de continuar exercendo controle para evitar que os Estados Unidos e o poder de suas multinacionais façam o que têm feito com outros países mais fracos.

Na juventude, embarquei no ideal revolucionário de Fidel Castro, um jovem de família abastada de latifiundiários que deixou a promissora advocacia para livrar seu povo da tirania de um ditador e da exploração de capitalistas americanos que faziam daquela paradisíaca ilha um excelente lugar para deleite turístico, de lindas mulheres atraídas pelos dólares e muitos cassinos. Fidel sonhou com a Ilha de Utopia de Thomas Morus, onde tudo a ser produzido seria igualmente dividido entre todos, numa sociedade solidária, sem assaltantes, mendigos e nem propriedade privada, um bem estar para todo o povo. E, apesar de utopia ser uma quimera, confesso que continuo acreditando que um dia Cuba vai respirar liberdade com alto nível de consciência política. Estive lá no chamado Período Especial, por trinta dias, em trabalho de solidariedade nos campos de Guines, provincia de Melena del Sur, e não vi um povo soturno, mas afetuoso, educado, dedicado ao estudo, às artes e à vontade de viver, apesar das duras dificuldades econômicas decorrentes do bloqueio que sofre e da falta de liberdade política. E não vi também crianças e adolescentes perambulando pelas ruas mendigando e fumando crack, nem violência e ladrões assaltando como aqui. Visitei escolas, hospitais e maternidades, tudo com acesso gratuito e com alto nível de qualidade, sem distinção alguma. Esse é o trunfo de Fidel. Falta a liberdade, essencial para vida humana digna, que um dia, talvez com Fidel passando à Histórial, seja alcançada. Raul Castro não quer afrontar o irmão, paciência.

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